7 de outubro de 2021
STF decide se delegado pode conceder medida protetiva
Reserva de jurisdição atinge vítimas de violência e Lei Maria da Penha.
Fecha de publicación: 14/09/2021
Etiquetas: Lei Maria da Penha, medidas protetivas, Decisão STF, violência doméstica, Brasil
Desde a sua implantação, em 2006, a Lei 11.340, conhecida como Maria da Penha, vem sendo modificada com o intuito de ampliar seu alcance e dar mais segurança às vítimas de violência. Uma delas, a Lei 13.827/2019, é alvo de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). Ela permite que a medida protetiva de afastamento do agressor seja concedida pelo delegado se o município não for sede de comarca, ou pelo policial, caso também não haja delegado de polícia no momento.
A ADI, proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), deverá ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no fim de setembro. No pedido, a Associação indica a ofensa ao princípio da reserva de jurisdição, uma vez que atribui à autoridade policial competência estrita ao Judiciário para ingressar no lar ou domicílio do cidadão, retirá-lo e mantê-lo afastado.
Para Ivana David, desembargadora e juíza criminal, não há o que se discutir sobre constitucionalidade. Ela lembra que entre os poderes próprios e especiais da autoridade policial estão o de intimação e condução de pessoas, realização de buscas, de interdição de locais e prisão de pessoas. “O delegado de polícia age em nome do Estado, integra carreira jurídica e todas as suas decisões têm, obrigatoriamente, esteio na lei”, afirma a juíza.
A advogada defende que a Lei é uma exceção e sua aplicação só é possível onde não há magistrado. Para ela, não se justifica impor à vítima de violência doméstica dificuldades e demora na efetivação de sua proteção. “A autoridade policial, legalmente investida, ostenta o poder e o dever legal de determinar as imposições de medidas protetivas”.
Tatiana Naumann , sócia do escritório Albuquerque Melo e especialista em direito de família e violência contra mulher, explica que a lei ainda não foi declarada inconstitucional e ainda está em vigor. “Feito o boletim de ocorrência, em 48 horas, em média, já se tem uma decisão concedendo ou não a medida protetiva. O Judiciário tem sido bastante eficaz na concessão dessas medidas, com plena observância ao devido processo legal”, afirma
Mayra Mallofre Ribeiro Carrillo, especialista em direito penal econômico e europeu e sócia do Damiani Sociedade de Advogados, avalia que as medidas protetivas atuam como mitigadoras de garantias fundamentais do cidadão, tais como o direito de ir e vir, o direito à liberdade ampla de locomoção. “Essa é a razão pela qual a análise judicial é imprescindível. Além disso, muito embora não tenhamos dúvida quanto à capacidade técnica e preparo dos delegados de polícia, é inconcebível reduzir a atuação do magistrado ao papel de mero ‘carimbador’ da decisão proferida pela autoridade policial, sobretudo quando diz respeito ao refreamento de direitos fundamentais.”
A reserva de jurisdição é um tema sensível ao Estado Democrático de Direito. Para Joaquim Pedro de Medeiros Rodrigues, advogado especialista em direito constitucional e sócio fundador do Pisco & Rodrigues Advogados, isso significa dizer que algumas questões precisam obrigatoriamente de uma decisão judicial fundamentada. Um exemplo é o bloqueio de bens, o levantamento de sigilo e o afastamento compulsório do lar.
“Por essa razão, embora faça sentido essa questão da urgência de medidas para proteger a mulher vítima de violência, é necessário que as medidas sejam deferidas por meio de decisão fundamentada – e não ao arbítrio da autoridade policial, que constitucionalmente não detém competência para processar e julgar”, avalia.
Daniel Bialski, sócio fundador do Bialski Advogados e especialista e processo penal, defende a possibilidade de que delegados determinem medidas protetivas. “Elas vão atingir e alcançar uma efetividade maior, acautelando e protegendo vítimas de violência doméstica, como também devem evitar um mal maior. Obviamente que essas medidas quando definidas pela autoridade policial, posteriormente, passarão por um reexame do crivo judicial. É muito importante qualquer tipo de mecanismo ou procedimento que possa desburocratizar a aplicação da lei e da Justiça. Será um grande ganho para toda a sociedade”.
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