25 de janeiro de 2022

Diferencial de alíquota do ICMS – empresa tem que pagar?

 

Como já vinha sendo alardeado, os estados deixarão de arrecadar cerca de 33% a 77% de ICMS relativa ao recolhimento do DIFAL (Diferencial de Alíquota) nas operações entre os estados de origem e destino de mercadorias destinadas ao consumidor final.

Uma situação inusitada está ocorrendo na cobrança do DIFAL ICMS, Diferencial de Alíquota do ICMS. Ocorre que empresas do segmento de varejo e e-commerce não estão obrigadas a pagar o DIFAL devido às operações interestaduais por falta de legislação complementar.

“Ocorreu uma decisão do STF e a partir de 1º de janeiro de 2022 não poderá ser cobrado o DIFAL nas saídas interestaduais destinadas a não contribuinte do ICMS, em razão do Poder Executivo não ter sancionado a lei complementar em tempo hábil. Portanto, pelas regras constitucionais, essa cobrança somente poderá ser feita a partir de 2023, visto que a Lei Complementar nº 190 foi publicada somente em 05 de janeiro de 2022”, explica o diretor tributário da Confirp Consultoria Contábil, Welinton Mota.

Ele explica que tal regra respeita o princípio constitucional da anterioridade anual e nonagesimal a que se sujeita o ICMS, ou seja, o imposto deve ser instituído com início de vigência a partir do ano seguinte e após noventa dias da publicação da norma. “Essa mudança impacta em todas as empresas que realizam operações interestaduais destinadas a não contribuintes do ICMS, principalmente as de e-commerce”, complementa.

Segundo o advogado Renato Nunes, especialista em direito tributário e sócio do Machado Nunes Advogados, já existem liminares que apontam que a decisão deve ser por não cobrar esse ano, mas somente em 2023. Ele aponta como exemplo o recurso extraordinário com repercussão geral no julgamento do RE 439.796-RG (Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, Tema 171).

Entenda o Diferencial de Alíquota

O Difal ICMS é uma solução criada para que o recolhimento desse imposto fosse feito de maneira mais justa entre os estados. Contudo, em 2015, foi publicada a Emenda Constitucional 87/2015 que alterou o recolhimento do ICMS devido às operações interestaduais destinadas à mercadoria de consumo para não contribuintes.

“Antes da emenda constitucional nas operações interestaduais destinadas à mercadorias para consumidor final de outro estado, o ICMS integral era devido apenas para o estado de origem da mercadoria. Isso beneficiava os grandes estados, como São Paulo e Rio de Janeiro, o que gerava a guerra fiscal entre os estados”, explica o diretor tributário da Confirp Consultoria Contábil.

Ele complementa a explicação lembrando que após a edição da emenda ficou definido que o ICMS seria devido parte para o estado de origem e a outra parte para o estado de destino. Por exemplo, se o produto comercializado fosse vendido de São Paulo para a Bahia, a alíquota do ICMS na operação interestadual é de 7%.  Este percentual é devido para São Paulo, no entanto, o mesmo produto dentro do estado da Bahia tem alíquota de 18%. Neste caso, o vendedor paulista (varejo ou e-commerce) teria que recolher o DIFAL, que é de 11%, ou seja, 18% da Bahia menos os 7% de São Paulo.

Acontece que o STF (Supremo Tribunal Federal) julgou inconstitucional a cobrança do DIFAL sem lei complementar e politicamente (para não prejudicar os estados) manteve a cobrança até 31/12/2021, e a partir de 2022 somente com a edição da legislação complementar.

“Segundo a decisão, fica estabelecida a seguinte tese de repercussão geral: ‘A cobrança do DIFAL ICMS, conforme introduzido pela Emenda EC 87/2015 pressupõe a edição de lei complementar veiculando normas gerais’. Por ter ocorrido em sede de repercussão geral, o entendimento deve ser aplicado em todas as medidas judiciais sobre o tema que estejam pendentes de julgamento definitivo. Além disso, os ministros entenderam por modular os efeitos da decisão para que esta produza efeitos apenas a partir de 2022, com exceção feita às ações judiciais já propostas”, explicou o sócio da Machado Nunes.

“Ocorre que no caso do ICMS, para que o DIFAL seja exigido depende do princípio da anterioridade anual e da noventena. Logo, para que valesse a partir de 01/01/2022 deveria ter sido publicada a lei complementar no máximo até 01/10/2021. Como não foi publicada em 2021, não pode produzir efeitos em 2022, segundo as regras constitucionais. E como foi publicada em 05 de janeiro de 2022, somente produzirá efeitos a partir de 01/01/2023, salvo se houver uma reviravolta no STF nunca antes vista”, explica Welinton Mota.

Na contramão disso, existe ainda outro fator importante a ser considerado e que poderá ocorrer. Atualmente, os estados estão aparelhados para exigir o DIFAL, inclusive, podendo apreender as mercadorias nas barreiras fiscais, caso o vendedor varejista não comprove o recolhimento do DIFAL. Pensando nisso, temos um cenário que poderá vir a ser caótico, caso algum estado utilize tal prática e o STF concorde, em decisão política, pois há muito dinheiro dos estados envolvidos.

Confusão à vista

Em novos capítulos dessa novela, já existem indicações que alguns estados devem passar a exigir esse tributo a partir de abril deste ano. No entendimento deles, não teria tido uma instituição de tributo, porque já existia o DIFAL antes. “No meu ponto de vista esse é um entendimento equivocado, sendo que houve o julgamento pelo STF como sendo inconstitucional o Diferencial de Alíquota, assim, aquela norma não existe desde a sua origem “, explica Renato Nunes.

Ou seja, ao realizarem a cobrança alegando que o tributo já existia, essas empresas estão desconsiderando o princípio da anterioridade anual, pois alegam que o tributo já existia. Isso fere frontalmente a constituição federal. As empresas que se sentirem lesadas deverão entrar com medida judicial para afastar a incidência do imposto a partir de abril até o fim de dezembro de 2022.

Veja um histórico da Diferencial de Alíquota do ICMS 

  1. Até 2015:
  • Não havia DIFAL nas operações interestaduais destinadas a não contribuinte;
  • Aplicava-se a alíquota interna do estado do remetente (era equiparada a operação interna).
  1. Em 2011, foi publicado o Protocolo ICMS-21/2011, onde: 
  • Estados das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste exigiam o recolhimento de parte do ICMS para o estado de destino (DIFAL de 5% a 10%), nas operações não presenciais por meio da internet;
  • Citado protocolo foi declarado inconstitucional pelo STF e perdeu sua eficácia desde fevereiro de 2014.
  1. A partir de 1º de janeiro de 2016 passou a vigorar a Emenda Constitucional nº 87/2015 para as operações interestaduais destinadas a não contribuinte:
  • Aplica-se a alíquota interestadual (4%, 7% ou 12%);
  • O DIFAL passou a ser devido para o estado de destino, inclusive, para empresas do Simples Nacional.
  1. Decisão final no STF – Tema 1093
  • Em 24 de fevereiro de 2021, o plenário do STF julgou inconstitucional a cobrança do DIFAL da EC 87/2015 sem lei complementar com repercussão geral;
  • Modulação dos efeitos: o STF garantiu aos estados a cobrança do DIFAL da EC 87/2015 até 31 de dezembro de 2021, excluídas as empresas do Simples Nacional, exigindo lei complementar para a cobrança a partir de 2022.
  1. Simples Nacional:
  • Também estavam obrigadas a pagar o DIFAL desde 1º de janeiro de 2016;
  • A partir de 18 de fevereiro de 2016 foi suspensa a cobrança do DIFAL para Simples Nacional, em virtude de uma medida cautelar até o julgamento final da ação (até hoje não foi julgada pelo STF, continuando suspensa).
  1. Lei Complementar nº 190/2022 (DOU: 05.01.2022): 
  • Regulamenta a DIFAL e prevê a produção de efeitos em noventena dias;
  • Contudo, como a Constituição Federal remete ao princípio da anterioridade anual, o DIFAL só “poderia” ser cobrado a partir de 1º de janeiro de 2023.
  1. Nota do COMSEFAZ – Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, de 05 de janeiro de 2022:
  • Estados não estão obrigados a interromper a cobrança do DIFAL;
  • Sinal de ‘chumbo quente’: estados poderão cobrar o DIFAL a partir de 05 de abril de 2022.
  1. O que fazer, caso os Estados passem a cobrar o DIFAL em 2022? 
  • Recorrer ao judiciário.